Monitorização de barragem hidroelétrica proporciona novos conhecimentos sobre emissões de carbono
A Barragem de Kariba retém o maior reservatório artificial do mundo e gera eletricidade para milhões de pessoas na Zâmbia e no Zimbabué. Um estudo recente da barragem mostrou como isso afeta a libertação de emissões de gases com efeito de estufa no reservatório e a jusante do rio. Usando a sonda multi-parâmetros YSI EXO2 da Xylem para monitorização contínua, os investigadores obtiveram novos conhecimentos sobre a forma como as centrais hidroelétricas podem ser otimizadas para reduzir as emissões de carbono.
A barragem de Kariba é um local impressionante. Situa-se ao longo da fronteira da Zâmbia com o Zimbabué e abrange o Rio Zambezi, um dos maiores cursos de água de África. A barragem tem 579 metros de largura, 128 metros de altura e 24 metros de espessura, criando o Lago Kariba, um reservatório com 223 quilómetros de comprimento.
Embora a energia hidroelétrica seja considerada uma fonte de energia “limpa”, os reservatórios hidroelétricos podem produzir emissões de gases com efeito de estufa a partir de matéria orgânica em decomposição. Contudo, a quantidade de emissões que é gerada e a forma como as emissões flutuam ainda não foram largamente estudadas.
Uma equipa de pesquisa do Instituto Federal de Tecnologia de Zurique, ETH Zurique, liderada por Elisa Calamita e pelo investigador principal Bernhard Wehrli, decidiu recentemente medir as emissões de gases com efeito de estufa da barragem de Kariba e a forma como estas flutuam.
“É amplamente reconhecido que existem emissões dos lagos e reservatórios, e que podem existir emissões a jusante dos rios dos projetos hidroelétricos,” afirma Scott Winton, um cientista de investigação da Universidade de Stanford, em Palo Alto, Califórnia, que foi um investigador pós-doutorado do ETH a trabalhar com Calamita. “É um grande desafio capturar todas as dinâmicas sazonais para estimar essas emissões com precisão.”
Cientista de investigação Dr. Scott Winton
Usando uma monitorização contínua, em vez de uma amostragem discreta, a equipa descobriu que o projeto hidroelétrico da barragem de Kariba liberta 18.000 a 35.000 toneladas métricas de carbono, como dióxido de carbono, por ano. A equipa do ETH Zurique também registou enormes variações sazonais e até mesmo diárias nas emissões de dióxido de carbono. Se a equipa tivesse usado apenas uma amostragem discreta, em vez da monitorização contínua, os seus cálculos poderiam ter sobrestimado as emissões de carbono em até 30% ou tê-las subestimado em até 90%.
O que causa flutuações nas emissões de CO2?
Winton explica que a matéria orgânica se decompõe quando cai no fundo dos lagos e reservatórios profundos, libertando dióxido de carbono (e, em condições anóxicas, metano). Quando o dióxido de carbono (CO2) flutua para a superfície do lago é libertado para a atmosfera. Contudo, grande parte permanece dissolvido nas camadas frias e mais profundas do perfil de água.
Este CO2 dissolvido nas áreas mais frias e profundas do reservatório e a jusante dos cursos de água contribui para as flutuações nas emissões. Quando as temperaturas sazonais se alteram, a água estratificada dos reservatórios mistura-se e pode conduzir a grandes e breves emissões deste CO2 há muito dissolvido. Adicionalmente, se as turbinas puxarem água destas zonas mais profundas, esta terá uma carga mais pesada de CO2 dissolvido.
As flutuações também podem ser causadas por variações na demanda. Na barragem de Kariba, a demanda dos clientes causa picos de eletricidade de manhã e ao final da tarde. Quando mais água é libertada do reservatório para responder à demanda, as emissões de carbono também podem aumentar.
Uma necessidade urgente de medir as emissões com precisão
O desafio para a maioria dos investigadores é o facto de estarem limitados a apenas algumas amostras e de terem de extrapolar as emissões a partir delas.
“Se estivermos dependentes de um processo manual – e com medições de fluxo de gás, é a isso que ficamos presos – temos maior probabilidade de falhar essas flutuações,” afirma Winton. “O que é tão importante relativamente à recolha de dados a longo prazo e automatizada é que isso pode ajudar-nos a captar discrepâncias sazonais e mesmo ciclos diários relacionados com as operações, como observámos no Lago Kariba.”
A equipa alertou para as grandes imprecisões nas estimativas de libertação de carbono das instalações hidroelétricas nos Proceedings of the National Academy of Sciences (Procedimentos da Academia Nacional de Ciências). O documento realça uma necessidade urgente de avaliações mais precisas, visto que há mais de 58.000 barragens com cinco metros ou mais em todo o mundo e cerca de 3.700 barragens hidroelétricas em construção ou em processo de planeamento.
Recolher dados horários com sondas multi-parâmetro YSI EXO2
Winton afirma que a ferramenta chave para reconhecer e quantificar as flutuações nas emissões foi o conjunto da equipa de sondas multi-parâmetro YSI EXO2. A cada hora durante cerca de um ano, cada sonda mediu temperatura, condutividade, pH e oxigénio dissolvido.
A sonda multi-parâmetro YSI EXO2
“Não poderíamos ter feito este estudo sem essa informação de alta frequência,” afirma Winton. “Ter um sensor que consegue estar ali colocado e medir de hora a hora durante um período bastante longo permite-nos responder a uma grande quantidade de questões que de outra forma não conseguiríamos responder. E, especialmente se estivermos interessados em energia hidroelétrica, muitas destas questões estão a ocorrer a uma frequência muito elevada, de hora a hora.”
Os cientistas do ETH Zurque mediram os níveis de dióxido de carbono em 17 locais no rio Zambezi, nos seus afluentes e no Lago Kariba. Estes também recolheram amostras de água para analisar no laboratório na Suíça a presença de dióxido e de metano. Finalmente, estes usaram instrumentos de YSI para medir a temperatura, oxigénio dissolvido, condutividade e pH para explorar a influência dos afluentes, medir as condições a um nível profundo do rio e validar os dados EXO2.
Prevenir fugas de carbono de barragens hidroelétricas
A monitorização a longo prazo da qualidade da água in situ poderia ser uma importante ferramenta na prevenção de elevados níveis de fuga de carbono de futuras barragens. Winton afirma que integrar sistemas que poderiam ir buscar água a diferentes camadas de um reservatório poderia ser uma estratégia útil para reduzir as descargas de CO2. Compreender a termoclina de um reservatório – a camada de transição entre água pouco profunda, água quente e água fria e profunda – é uma parte essencial desta estratégia.
“Uma coisa que podemos fazer se tivermos uma nova barragem, ou se pretendermos renovar uma já existente, é determinar ‘de onde está a vir a água?’” afirma ele. “Se tivermos uma infraestrutura onde podemos manter registos do conteúdo de oxigénio nas águas mais profundas, oxigénio nas águas pouco profundas e a altura da termoclina, e depois tivermos um sistema de admissão onde podemos escolher a que profundidade estamos a ir buscar a água, poderíamos potencialmente evitar uma grande parte deste problema.”
A melhor vantagem para Winton foram as descobertas que podem advir de fazer perguntas importantes a uma equipa de investigação multidisciplinar.
“Basicamente, fomos até à Zâmbia com uma questão geral, que era ‘qual é o estado da qualidade da água nesta bacia e quais são as ameaças à mesma? Como é que as barragens vão afetar isso?’” afirma Winton.
A resposta tem enormes implicações para compreender o que está a acontecer nas profundezas dos reservatórios por detrás de milhares de barragens e a forma como os decisores avaliam os impactos da energia hidroelétrica.
Ler a história completa e mais
Descarregar o número #9 da revista gratuita YSI, Missão: Água.
Escrito por Steve Werblow. Fotos de Scott Winton e ATEC-3D Ltd.